quinta-feira, 21 de maio de 2009

Livro narra a vida de Roberto Pires

Cultura
Livro narra a vida de Roberto Pires
Publicada: 13/05/2009 | Atualizada: 13/05/2009
http://www.digita.com.br/tribunadabahia/news.php?idAtual=8534

Dentro da Coleção Gente da Bahia, uma iniciativa da Assembleia Legislativa, foi lançado semana passada mais um exemplar, desta vez a contemplar o realizador baiano Roberto Pires, diretor de "Redenção", o primeiro longa metragem feito na Bahia, que procura biografar o cineasta. Seu autor, Aléxis Gois aplica o "vol d’oiseaux" na descrição da trajetória de Pires como cineasta e inventor, a destacar sua habilidade e seu grande amor pela chamada sétima arte. Nota-se que o livro foi escrito com a pressa necessária para ser lançado quando da homenagem aos 50 anos de "Redenção", a considerar que, neste 2009, o filme completa o seu cinquentenário já que seu lançamento se deu em março de 1959 numa "avant-première" de "black-tie" no majestoso cinema Guarany da Praça Castro Alves.

Se vivo estivesse, Roberto Pires completaria 75 anos, pois nasceu a 29 de setembro de 1934, sendo cinco anos mais velho do que o seu amigo Glauber Rocha (1939). A leitura do livro de Aléxis Gois é muito interessante, pois mostra a tenacidade, a persistência e a coragem da aventura do cinema numa época em que a Bahia não dispunha de equipamentos para se fazer cinema e muito menos um longa metragem, um filme de longa duração.

A ideia de "Redenção", cujo primeiro título era "Estalagem 25" surgiu em 1954 e dela até a concretização do projeto se passaram 5 anos, ainda que as filmagens propriamente ditas tenham começado em 1956. Naquela época tinha surgido a lente anamórfica, Cinemascope, lançada pela Fox em "O manto sagrado" ("The robe", 1953), filme bíblico com Richard Burton e Jean Simmons, cuja tela larga e som estereofônico despertaram o entusiasmo dos soteropolitanos quando lançado, dois anos depois, em 1955, no mesmo Guarany.

Roberto Pires ficou entusiasmado com o Cinemascope e pretendeu realizar seu filme neste formato. E resolveu "inventar" uma lente anamórfica. Pediu ao operador do Guarany um fotograma de "O manto sagrado" e, a partir daí, veio a compreender a "compressão" da imagem e a necessidade dela ser exibida com uma lente especial para "alargá-la". Seu pai tinha uma ótica, a Casa Mozart, e, nela, Pires trabalhou para conseguir um resultado capaz de obter o "anamorfismo" na lente. E mais: inventou também o som magnético, colando-o no próprio celulóide.

Cineasta e inventor, eis Roberto Pires, um realizador que sabia tudo sobre cinema. Não se limitava a ser um diretor cinematográfico, mas, além da lente e do som, tinha profundo conhecimento de iluminação, do corte funcional, do enquadramento. E onde, poder-se-ia perguntar, aprendeu tudo isso? Vendo filmes policiais e de aventuras do velho cinema americano, frequentador que era, assíduo, dos "poeiras" da Baixa dos Sapateiros, quando entrava, nos fins de semana, 2 da tarde e somente saía na última sessão. Naquela época os cinemas de segunda categoria exibiam três filmes a preços mais que módicos.

Embora Roberto Pires tenha sido o grande responsável pela concretização do projeto, ele não sairia do papel não fossem as intervenções de Élio Moreno Lima, de Ilhéus, que tinha fazenda de cacau, Oscar Santana, velho amigo e companheiro desde os seus primeiros curtas ("Sonho" e "O calcanhar de Aquiles"), Braga Neto. Um nome deve ser colocado ao lado deles: o do fotógrafo Hélio Silva, que ajudou e ensinou a eles a técnica da iluminação.

Um verdadeiro fenômeno o sucesso de bilheteria de "Redenção", que foi lançado simultaneamente nos cinemas Guarany e Tupy (o exibidor Francisco Pithon gostava de colocar termos alusivos aos indígenas nos cinemas que administrava, a exemplo dos citados e do Tamoio). Filas quilométricas: uma para comprar o ingresso que se estendia pela rua Ruy Barbosa inteira, e outra, fila de entrar, já com o ingresso comprado, que se estendia até a Barroquinha.

Surpreendente, no dia da ‘avant-première’, Roberto Pires não compareceu à sessão de gala. Segundo contou Raimundo Mendonça, seu amigo, ele já estava "cheio" de ver "Redenção" e foi ver outro filme. Mas ficava todo dia dentro de um abrigo frente ao Guarany, na Praça Castro Alves, a admirar, junto a Oscar Santana e Braga Neto, as imensas filas que tomavam conta da praça do poeta. A bilheteria estourava. As salas, entupidas de gente a sair "pelo ladrão".

No domingo (antigamente os filmes eram lançados as segundas), Roberto entrou para falar com o exibidor Francisco Pithon, que tinha um escritório dentro do Guarany, e viu, para sua surpresa e estupefação, os letreiros de madeira serem retirados da fachada principal. Pensou com seus botões que, dado o sucesso retumbante, o exibidor talvez quisesse aumentá-los de tamanho. Mas ao chegar ao escritório, Pithon lhe disse que o filme, apesar de ter a maior renda desde a inauguração da sala, iria ser retirado de cartaz, porque ele tinha compromisso com as distribuidoras americanas.

Eis aí, contundente, o grande drama do cinema brasileiro, que perdura até hoje. O controle do mercado exibidor está em mãos de multinacionais estrangeiras. No caso de "Redenção", mesmo com o lucro que estava a auferir, o exibidor teve que se curvar aos interesses das companhias americanas.

Nenhum comentário:

Postar um comentário